Eu tô ficando é velho, não é doido não!

idades, crise, felicidades, prazeres, tempo e 30 anos.

TOTALLY DESPERATE

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Eu sou um grande fã da série Desperate Housewives (2004-2012), criada por Marc Cherry. A série fenomenal acompanha a vida de 5 amigas em um subúrbio americano bem estereotipado depois que a sexta comete suicídio nos dois minutos iniciais do primeiro episódio. A dona-de-casa suicida (essa personagem é tão importante na minha vida que ela está entre as pessoas que eu dediquei minha monografia de conclusão de curso) se torna narradora e comentarista das confusões em que as outras se metem.

Isso mesmo. CONFUSÕES.

O grande choque e o que tanto me atraiu não foram especificamente as aventuras que elas aprontam – apesar de que essas são muito boas também -, mas o tipo das protagonistas: mulheres em torno de 40 anos, típicas donas de casa que fazem supermercado, pregam botões e colocam filhos pequenos para dormir.

Eu achava que a série era completamente ficcional, que mulheres como aquelas jamais teriam aquele tipo de problemas. Atração por outros homens que não fossem seus maridos, anseios por voltar ao mercado de trabalho, abuso do marido ou dos filhos e outras mais. A minha burra certeza se dava porque eu via como exemplo desse tipo de mulher a minha mãe. Grande erro! (Pode colocar aí a vinheta do Cumpadi Washington dizendo para mim “Sabe de nada, inocente”).

Assim como eu, Marc Cherry também não conhecia sua própria mãe. Ele teve a ideia de fazer a série quando, em um momento sem emprego, sem dinheiro e de volta a morar na casa dos pais, assistindo TV eles viram um noticiário sobre uma mulher americana que havia afogado os 5 filhos numa banheira. Por quê? Ninguém sabia…

Ao ouvir a notícia, sentado no sofá ao lado da mãe, Marc faz uma pergunta retórica:

– O que leva uma mulher a tal ponto de desespero que a faz matar os próprios filhos?

– Eu quase estive lá… – respondeu ela como quem fala quantas colheres de açúcar vai querer no café.

A partir daí, a senhora Cherry desfia para o filho todo o rosário das agruras pela qual  passou na vida enquanto o seu marido fazia um mestrado no Canadá e ela tinha que trabalhar, cuidar dos filhos, da casa e ainda por cima cuidar da própria vida. E melhor, ela não só contou a vida dela como a das suas amigas, mulheres que até então, para Marc, viviam felizes e sem problemas, só passeando em shoppings e esperando os maridos chegarem em casa para por a mesa do jantar. Esse foi o material que gerou uma das séries mais avassaladoras e inesperadas da história da TV mundial.

Essas mulheres – incluindo minha mãe -, não deixaram de viver um minuto sequer das suas vidas. Aliás, essas vidas que me pareciam planas e sem maiores ansiedades, as quais a maior felicidade era quando a uxória do jardim estava florida, tem tanta brasa para queimar quanto a minha, que tudo o que eu queria na época era ir pra rua e curtir adoidado.

O melhor de tudo é que à medida que o tempo foi passando, essas desperate housewives deixaram de ser as amigas da minha mãe e passaram a ser meus amigos e amigas, qualquer um que tenha uma casa – incluindo a mim mesmo -, porque parece que todo mundo se desespera quando o negócio é mexer no delicado campo domiciliar.

Para escrever este post, reassisti meu episódio favorito no qual uma dona de casa ao descobrir que o marido a traiu faz de reféns um grupo de clientes no supermercado dele. Ela mata, xinga, se descabela e quebra a dieta.

Ao rever o episódio, me assustei ao sentir as lágrimas descendo novamente nas mesmas cenas e nas mesmas frases ditas de quando eu o vi pela primeira vez. Eu estava crente que tinha o couro mais duro. E o que me emocionou mais foi lembrar porque ele havia me marcado tanto. Ele me mostrou que o desespero dela também estava dentro de mim e que eu poderia chegar àquele nível.

Algumas das desperate housewives descobrem a mesma coisa ao longo do episódio. Aí Marc Cherry foi certeiro, pois não só me fez ver o desespero de uma dona de casa, mas o meu próprio.

Se você tiver em torno de 20 anos e ler esse texto, a partir de agora observe melhor os seus pais. Eles não são apenas os seres que te atrapalham sair e dão dinheiro para você por crédito no celular. Tente vê-los como pessoas que têm uma vida tão complexa quanto a que você acha que a sua é (sei que é difícil, mas façam uma forcinha). Se ficar muito difícil esse exercício de imaginação, pense ao menos que você teve muita sorte por ter escapado de ser afogado na banheira, porque pelo visto essa é uma possibilidade que passa pela cabeça de todos os pais em algum momento.

2 comentários em “TOTALLY DESPERATE

  1. Jorge F.
    5 de junho de 2014

    Own…texto lindo. Eu sempre fiz certas perguntas para minha mãe, vai que ela tem a cabeça fervorosa de uma personagem literária. Algumas vezes notei que não era a resposta completa, outras que ela estava completamente sincera. Mas a coisa mais importante que minha mãe sempre falou é que trabalhar impede de pensar besteiras, chega cansada do trabalho e quer mais é abraçar os filhos, dar um xamego no marido e dormir pra encarar o outro dia. Olha aí, mamãe sendo uma personagem literária.

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Publicado às 5 de junho de 2014 por em Família, Humor, Memórias, TV e marcado , , , , .